Adornado com acenos ao passado, “Wish”, realizado por Chris Buck, responsável por “Frozen”, e Fawn Veerasunthorn, que trabalhou em “Moana” e “Raya and the Last Dragon”, veste a sua herança como um manto, numa viagem autorreferencial que, embora seja encantadora na sua homenagem às raízes da Disney, corre o risco de ser ofuscada pela sua ambição.
Na sua tentativa de celebrar um legado, “Wish” pisa, de facto, uma linha ténue entre a homenagem e a imitação. A narrativa do filme, centrada numa jovem corajosa num reino fantástico, preenche todos os requisitos de um conto clássico da Disney, desde animais que falam e números musicais extravagantes, a um antagonista malvado que exerce uma magia sinistra.
Algures no Mediterrâneo existe uma ilha onde todos são bem-vindos. Todos querem visitar a ilha onde o rei Magnífico remove desejos dos corações e das memórias de cada um, para que ninguém se sinta triste por eles não se realizarem. Porém, muito ocasionalmente, o rei realiza um desses desejos. Asha gostaria de se tornar sua assistente, mas durante uma audiência que lhe é concedida, descobre que esta prática não é de todo ideal e justa. Desta feita, quando Asha decide pedir um desejo às estrelas, uma delas vem visitá-la pessoalmente.
O número de personagens forçadamente engraçadas no filme permanece limitado, permitindo que Valentino, um bode (fiel companheiro de Asha) se torne o complemento humorístico perfeito. Apesar de algumas piadas bem construídas, o filme não se centra na comédia. Em contrapartida, o foco primordial incide no espírito de Walt Disney (no sentido figurado). Em cada um de nós, deve existir uma sede ou um propósito de realização. O desejo, a dedicação e humildade para se alcançar a meta. E mesmo que não se realize, que não seja possível, alimentar uma certa esperança, mas nunca permitir que alguém nos roube os sonhos. Esses, que são tão nossos, tão de cada um. Quem rouba um desejo a alguém corre o risco de sofrer pena de prisão num espelho.
O filme contém muitos números musicais, não obstante, à primeira vista não são memoráveis. A canção na floresta termina com a repetição das palavras “és uma estrela” e isso marca a narrativa, mas existe a falta de um “Let It Go” pelo meio. Quem sabe, talvez os pais possam contradizer-me daqui a uns tempos. Desta vez, a Disney não recorreu a Lin-Manuel Miranda (de “The Little Mermaid” e “Encanto”), mas o seu estilo é reconhecível.
A estrela da companhia é exatamente a personagem de uma Estrela, a criatura mágica que realiza o desejo da personagem principal. A Estrela quer que Asha liberte todos os desejos que o rei Magnífico mantém em cativeiro. O tempo de duração de uma hora e meia faz com que o seja fácil de acompanhar, o que é claramente útil para os espectadores mais jovens. O epílogo é um pouco apressado, ao passo que seria enriquecedor um olhar mais longo sobre o novo status quo, o triunfo de um povo. Ou seja, “Wish” é mais do que apenas a sua história; é sobre uma comunidade que reclama o poder em conjunto. A força coletiva é uma afirmação poderosa que o filme pretende fazer, triunfando sobre o heroísmo individual.
“Wish” marca uma mudança ousada para a Disney, aventurando-se para além da sua abordagem de animação convencional. Sob a orientação da equipa criativa de “Frozen”, o filme utiliza visuais suaves, semelhantes aos de um livro de histórias, que misturam o encanto dos contos de fadas clássicos com técnicas de computação gráfica de ponta. Embora esta mistura inovadora de 3D moderno e arte tradicional de aguarela resulte ocasionalmente num ligeiro desfasamento entre as personagens e os seus ambientes, é um esforço louvável de experimentação artística. O filme destaca-se pela sua tentativa de fundir estes dois estilos, mostrando a habilidade dos seus artistas e ultrapassando os limites da animação tradicional.
Tecnicamente falando, o filme expõe o legado de um século num resumo de 95 minutos visualmente deslumbrante, misturando acenos nostálgicos com uma história sobre a luta pelos desejos de cada um em comunidade. Embora o filme apresente uma tapeçaria de referências ao passado histórico da Disney, por vezes perde-se na sua própria homenagem, perdendo oportunidades de forjar novos caminhos mágicos. A viagem de Asha, embora vibrante e comovente, é ofuscada pelo facto de o filme se apoiar excessivamente em elementos familiares.
A dada altura na história, o rei Magnifico usa os desejos para fazer crescer a magia negra dentro de si. Com isto, o filme não passa a mensagem de que devemos trancar os desejos ou esperar que se realizem todos de uma assentada como por magia. Está a dizer que os desejos inspiram esperança, e que, por isso, não os devemos esquecer. É essa a mensagem para as crianças.
A lição instrutiva de “Wish” é que, embora nem sempre os nossos desejos possam realizar-se, existe sempre espaço para viver com o coração apontado a outros feitos. Só existe uma regra primordial a seguir: pedir um desejo é sempre permitido, no entanto, a responsabilidade de o realizar não é de outrem. O que será que as estrelas guardam para cada um de nós?