Ambientado no século XIV, “The Green Knight” conta a história de Dom Galvão, o sobrinho imprudente e obstinado do Rei Artur, que embarca numa aventura ousada para enfrentar o Cavaleiro Verde. O jovem enfrenta fantasmas, gigantes, ladrões e trapaceiros, numa demanda que promete revelar o seu verdadeiro valor aos olhos da família e, consequentemente, do reino.
“Dom Galvão e o Cavaleiro Verde”, imortalizado num poema anónimo do século XIV, surge entre as histórias mais populares em torno da lenda do Rei Artur.
Nesta história, durante o dia de Ano Novo, o Rei Artur e os cavaleiros da Távola Redonda reúnem-se em Camelot para festejar e trocar presentes. A dada altura, um misterioso Cavaleiro Verde interrompe as festividades e propõe um tipo diferente de troca: qualquer um dos cavaleiros pode atacá-lo com um golpe do seu machado e, em troca, o Cavaleiro Verde regressa um ano depois para devolver o ataque. Dom Galvão, o mais jovem dos cavaleiros e sobrinho do Rei Artur, aceita o desafio do Cavaleiro.
Por norma, quando David Lowery decide apostar num projeto, sabemos que o resultado final tem de ser de qualidade. Seja através da conceção de uma nova versão de um clássico da Disney ou pela adaptação de um livro, o cineasta emprega uma abordagem visionária ao que, até à data, tem oferecido ao público.
E, efetivamente, “The Green Knight” é um passo em frente nesta carreira. Transformar um poema do século XIV num filme, é um desafio assinalável.
O objetivo do realizador era permanecer fiel aos principais temas do poema, ao mesmo tempo que tornava a história de Galvão mais ressonante para o público moderno. Assim, Lowery optou por espelhar jovem imaturo que aspira ganhar o direito de se juntar aos Cavaleiros da Távola Redonda, para provar a sua honra e bravura – confrontando algumas verdades sobre si mesmo ao longo da aventura. (No poema, Galvão já é um cavaleiro ilustre).
A direção artística e o design de produção são imaculados, porque quanto mais conhecemos a aventura de Galvão, vamos ganhando mais tempo para admirar a construção daquele universo. O movimento da câmara brinca com as paisagens isoladas e a proporção dos lugares, facultando, por isso, a mesma atmosfera de um jogo em mundo aberto.
Contudo, o filme é lento e, por isso, por ser tranquilo e ambiental, exige mais ênfase na aventura em si do que na ação ou violência. Enquanto Dom Galvão viaja por um mundo místico, ficamos surpreendidos com a beleza dos cenários, mesmo que não haja muito a acontecer de forma temática. Galvão não é um homem de muitas palavras e é mais reacionário ao mundo que está a explorar.
Patel faz um trabalho magnífico na pele de Dom Galvão. Já que a história serve para expor o caráter da personagem, a performance de Patel caminha numa linha equilibrada entre força e medo. Em adição, existem ótimos membros do elenco que roubam os holofotes com frequência. Barry Keoghan tem uma cena incrível em que mastiga o cenário com muita energia e, não obstante o seu tempo no ecrã seja limitado, ele tira o máximo proveito disso. No seu retrato de Essel, Alicia Vikander é, como sempre, envolvente, especialmente durante a última metade do filme. Erin Kellyman, que tem ganho bastante destaque ultimamente na indústria, tem uma cena sobrenatural notável. Quanto a Ralph Ineson, é uma escolha coesa para o Cavaleiro Verde.
Existe muita profundidade nos personagens secundários, que ajudam Galvão a chegar ao seu destino. A maioria deles talvez fale como personagens de Tarantino que acabaram de descobrir Chaucer.
Eduardo Lourenço dizia: “Mais importante que o destino é a viagem”. Este filme é a personificação dessa frase. As demandas de um herói não têm de ser sempre repletas de batalhas sangrentas e encontros casuais com criaturas mágicas. Na grande maioria das vezes, o herói está sozinho, e é obrigado a enfrentar os próprios medos e o maior inimigo de todos, a própria mente. Por conseguinte, só no ato final é que vemos os resultados da aventura de Galvão.
A A24 tem aqui mais um vencedor em mãos, mas não visa agradar fora do seu público normal.