Violation (2020) foi um dos primeiros filmes que vimos na 15ª edição do MotelX e é daqueles filmes de “digestão complicada” que vai ficar marcado nas nossas mentes por algum tempo.
Confesso que muito dificilmente vou querer repetir o seu visionamento dado o quão perturbador esta experiência foi.
Não posso aconselhar este filme porque vai depender muito daquilo que aguentamos, vi muitas pessoas desistirem, mas as que ficaram sabem bem o que aconteceu e é incrível que esta seja a primeira longa-metragem de Dusty Mancinelli e Madeleine Sims-Fewer!
A sinopse é bastante simples: Miriam, tem um casamento à beira da ruptura, procura reacender a relação passando umas férias com o seu marido na casa da irmã mais nova, que não vê há muito tempo. Durante a estadia na casa de campo da irmã, Miriam acaba por aproximar-se do seu cunhado, Dylan. Este sente uma atração por Miriam e o que começa com um simples beijo, termina numa violação. Miriam avisa a irmã, mas esta recusa-se a acreditar. Sozinha prepara uma vingança.
Desde cedo sentimos que estamos perante algo pesado, fruto da relação de Miriam com o seu marido, mas ao invés de aliviar esta tensão o filme consegue arranjar forma de ir ficando cada vez mais obscuro. Isto deve-se ao facto de apesar de fácil compreensão, Violation não é linear, indo buscar todos os momentos de tensão em vários pontos da vida de Mariam antes e depois da dita violação que a vão moldar como pessoa.
Há que dar o mérito às realizadoras, pois conseguem manter a simplicidade nesta linearidade de maneira a que o espectador foque-se noutros detalhes que não em pensar como está tudo montado temporalmente e aí é que o filme se destaca. Ou seja, vamos ficar muito mais presos aos diálogos, cenas grotescas e relações do que perder tempo a montar na nossa cabeça a real ordem dos acontecimentos.
Claro que todo o filme fica ofuscado pela vingança propriamente dita, é uma cena que começa como um mero encontro de amantes, escaldante e de cariz puramente sexual e transforma-se para uma cena de atacante e vítima. Esta mudança é tão repentina e tão crua que faz com que o espectador fique de queixo caído por minutos… pior ainda, provoca empatia com o violador por tudo o que este está a sofrer.
Neste ponto Violation torna-se agonizante, mas tem o dom de se manter interessante e confiante após a cena e isso deve-se muito ao espetacular elenco, sobretudo a Madeleine Sims-Fewer que para além de realizadora é também a protagonista (Miriam) e a sua personagem é muito mais complexa que uma mera vítima visto que luta contra os seus próprios demónios que fazem com que a sua irmã não acredite na violação. Claro que o outro destaque vai para Jesse LaVercombe, no papel de Dylan, como já referi, é um violador e consegue fazer com que haja empatia…
O ponto menos conseguido é o final, onde já se sente que a trama já está a arrastar e dá-nos uma conclusão que por si só é algo dúbia, talvez merecesse algo mais inquietante ou mais transparente, porque o filme é fácil compreensão e directo e o fim deveria ser no mínimo mais claro.
Tirando isso, Violation é uma experiência, sem satisfação, carregada de crueldade e apenas uma perturbadora visão de uma vingança crua acreditando que é o mais próximo que temos de uma veracidade do ponto de vista da vítima.