“Quando deixamos de ter esperança…acontecem coisas boas”. Esta frase pode parecer trivial, mas quando se trata de Madame Rosa e do jovem Momo, em “The Life Ahead”, este conjunto de palavras forma – literalmente – o ponto crucial de uma relação desmesuradamente esbelta. Bem escrito e comovente, “The Life Ahead” exalta a forma como duas pessoas amarguradas pela vida, conseguem entrelaçar-se no afeto.
Ambientada em terras italianas, esta história começa com um breve vislumbre do terceiro ato, antes de voltar no tempo, e chegar a esse momento exato. É um dispositivo narrativo que já foi usado muitas vezes, mas que, neste caso, ajuda a enfatizar a gravidade emocional do que aconteceu.
Porém, antes de chegarmos lá, começamos por ser apresentados a Momo, um rapaz de 12 anos que “ganha a vida” a roubar inocentes. Por conseguinte, quis o destino que uma dessas inocentes fosse Madame Rosa, uma sobrevivente do Holocausto que, depois de se reformar de uma longa carreira na prostituição, toma conta de crianças.
Os dois primeiros atos trabalham para construir os dois personagens, e servem para jogar com ideias de esperança e trauma. Assim, vamos conhecendo várias relações significativas que Momo tem ao longo do tempo; desde o rapaz com quem divide o quarto em casa de Rosa, até aos “amigos” da rua. Momo faz-se de forte, e, consequentemente, guarda as suas crenças num cofre.
Enquanto que Momo procura, em segredo, por uma réstia de esperança, a Rosa profundamente conflituosa e multifacetada de Sophia Loren luta para controlar os demónios que dominam o seu trauma. A sua história é tão fascinante como a de Momo, na fachada a esmorecer lentamente para mostrar uma mulher fragilizada por uma guerra terrível.
Dez anos depois, Loren regressa ao mundo da representação com uma atuação magnífica. Na sua condição de figura quase paternal, a abordagem da atriz é verdadeiramente autêntica, com batidas emocionais tratadas com delicadeza e respeito pela personagem.
Todavia, Ibrahima Gueye, na pele de Momo é, sem dúvida, a estrela de “The Life Ahead”. Ao mesmo tempo que Loren regressa aos ecrãs neste filme, Gueye começa a sua aventura na indústria. A prestação do jovem vai além do que se esperava. Loren e Gueye cimentam uma química fascinante entre os personagens – o vínculo que floresce entre Madame Rosa e Momo é visto a crescer de uma forma cativante e quase hipnótica.
Embora alguns momentos do filme pareçam ter um ritmo demasiado lento, isso não diminui a elegância geral do resultado final. Na verdade, podemos ver estes alongamentos mais lentos como um momento de reflexão; um período de tempo não intencional para permitir que a história tome, quase de assalto, a mente do público.
A escrita é sensível, numa gama de formas que torna a história maleável para qualquer espetador, isto é, deixa que o público interprete os eventos, e que se envolva, positiva ou negativamente, com os personagens. Não é uma fórmula inédita, mas “The Life Ahead” é um exemplo envolvente e sentimental de como esta experiência pode correr bem.
“The Life Ahead” é uma joia escondida, no leque de opções disponíveis atualmente na Netflix. É um passeio cinematográfico delicioso, mas delicado.