A mais recente reencarnação de Super-Homem têm sido alvo de muitos comentários, negativos e positivos. Ao fim destes anos todos, será que alterei a minha opinião relativamente a este filme?
O ano era 2013. Este que vos escreve tinha 19 anos quando se sentou na cadeira da sala IMAX para ver a grande estreia de “Man of Steel” no grande ecrã. Já habituado às andanças dos filmes de super-heróis (muito devido ao crescente sucesso da MCU), estava mais que pronto para ser arrebatado com esta nova aventura vinda dos corredores da DC.
2 horas e 20 minutos depois, saio da sala com o pensamento de dever cumprido. Estava visto o filme. Mas, não conseguia desligar a sensação mista que tinha em mim. Apesar da imensa quantidade de acção que me foi injectada, a verdade é que sentia que o filme não tinha causado grande impacto em mim.
Desde então, nunca senti o desejo de o voltar a revisitar. Certamente que já tinha passado os olhos por algumas cenas do filme, principalmente quando estou a fazer zapping. Mas desde a fatídica noite de Verão de 2013 que não tinha visto “Man of Steel” de uma ponta à outra.
Mas a quarentena tem destas coisas. E, como que por impulso, decidi rever esta versão de Super-Homem pela mente de Zack Snyder. E abordei como se o visse pela primeira vez. Fiz tabula rasa e dediquei me a desvendar este mundo como se de um filme novo se tratasse.
E, não sei se foi por estar mais maduro, se por ter deixado as minhas expectativas do lado de fora da sala, mas a verdade é que tive muito mais prazer e senti-me mais desafiado intelectualmente desta vez em comparação com a primeira que o vi.
Antes de tudo, começo por dizer que “Man of Steel” não é perfeito. Longe disso. Apesar da estrutura narrativa não cronológica ser interessante para contar uma história de origem, retira algum do impacto emocional que pretende.
Para além disso, nalguns momentos o diálogo não se adequa ao contexto. Apesar de poder parecer brilhante no contexto escrito, quando transposto para o formato de filme o diálogo tornar-se demasiado explicativo ou, em certos instantes, estúpido (desculpem-me a franqueza).
Porém, fora isso, “Man of Steel” é um belo filme. Aliás, agora considero que este até pode ser um dos filmes de banda-desenhada mais underrated até ao momento.
Zack Snyder retira a inocência e a ingenuidade que havia no Super-Homem conhecido desde a sua criação, colocando-o no século XXI. O contexto social e cultural em que vivemos é bastante diferente daquele em que a personagem foi criada. Portanto, este Super-Homem é visto com os óculos do novo século, com lentes escuras mas com uma visão mais aprofundada.
Assim, Snyder não se inibe e debate temas como religião, determinismo, parentalidade e, até mesmo, imigração. Assuntos sérios num filme sério, que não tem medo de explorar uma faceta mais obscura pouco explorada noutras entradas do mesmo género.
Fazer um filme em que Super-Homem se ocupava em salvar gatinhos das árvores (como muitas vezes se viu nas páginas aos quadradinhos) não se adequava. Tornava-se obsoleto com uma grande rapidez.
Tendo em mente um contexto mais actual, este “Man of Steel” coloca questões existenciais, apresentado várias perspectivas sobre a existência de uma entidade vista como um Deus a caminhar pela Terra. São vários os caminhos morais colocados diante de Super-Homem e decidir qual é o melhor caminho a seguir nem sempre é o mais fácil. E o filme não tem medo de mostrar isso.
Até mesmo todo o contexto de parentalidade é duo, sendo que cada um dos pais de Super-Homem, Jonathan Kent e Jor-El (interpretados na perfeição por Kevin Costner e Russell Crowe, respectivamente), têm visões diferentes relativamente ao futuro do rapaz e de como ele deverá encarar os seus poderes. No fim, percebe-se que o melhor resultado é uma junção entre as duas filosofias.
As referências à religião e à comparação de Super-Homem com Deus estão presentes desde o início. Umas vezes mais descaradas que outras, mas todas as referências, sejam estas através de simbologia ou com recurso a diálogo, colocam em questão a aceitação de uma personificação de uma divindade na nossa sociedade.
Todas estas questões filosóficas e existenciais estão embrulhadas numa embalagem recheada de acção, com um ritmo acelerado e uma adrenalina contagiante, deixando ao espectador pouco espaço para poder recuperar o fôlego.
Ao terminar esta minha segunda viagem por “Man of Steel” percebi que o filme tem as suas falhas. Mas consegui relacionar-me com ele a todo um novo nível, que não tinha conseguido atingir em 2013.
Este é um Super-Homem ao qual o público não estava habituado. Para muitos, é um Super-Homem inaceitável, sem a sua essência de animação.
É uma visão escura deste Mundo. Que faz mais perguntas do que fornece respostas. Que está mais preocupado em apelar à discussão de ideias do que em simplesmente ser um filme para entreter o espectador, de digestão rápida.
Agora sim percebo a visão de Zack Snyder. Percebo tudo o que ele queria fazer com a personagem, com início em “Man of Steel” e subsequentes sequelas que nunca chegaram a acontecer. É pena.
Eu ganhei um novo apreço relativamente a este filme. E considero que deve ser revisitado, até mesmo por quem não gostou ou que não o vê há muito tempo. Há algo de novo aqui, de inovador, que não foi devidamente apreciado na altura em que o filme saiu. Talvez esteja na hora de o ser.