“Once Upon a Time…in Hollywood” estreou a 15 de Agosto nas salas de cinema em Portugal. O AXN Black como preparação para este filme transmitiu uma série de filmes que Tarantino elegeu para os fãs entrarem na onda da sua nova longa-metragem. Entre eles, surge “Easy Rider”, o filme que Dennis Hopper realizou em 1969.
Em 1969, quando houve uma onda de protestos contra a discriminação, a Guerra do Vietnam (na sua época mais intensa), e quando a mentalidade política e social estava a mudar, surgiu um filme que daria aos cineastas uma nova liberdade artística.
O sucesso do filme viria a causar uma mudança no sistema de Hollywood. Os estúdios retiraram o poder aos produtores e entregaram-no aos próprios artistas, permitindo aos realizadores e argumentistas uma margem de tolerância que ajudaria a cristalizar os anos setenta como a década mais prolífica da história do cinema.
Desta feita, Easy Rider, que foi concebido por Dennis Hopper, Peter Fonda e Terry Southern, incide na história de dois motoqueiros que fazem o percurso de Los Angeles a Nova Orleães na era do Vietnam na América.
Hopper teceu uma espécie de Western, com Wyatt (Peter Fonda) e Billy (Dennis Hopper) a cavalgar pelo horizonte como dois solitários num caminho simbólico através de uma sociedade em transformação.
Tal como John Ford ou Howard Hawks, Wyatt e Billy ajudaram a articular o desejo de uma geração em deixar uma marca num país em mudança. Porém, estes dois homens foram para a estrada em busca de uma liberdade que nunca chegariam a alcançar.
A América de Easy Rider está cheia de ameaças. Do dono de um motel rodoviário que se recusa a deixá-los ficar no seu estabelecimento devido à sua aparência, passando pelos polícias que os prendem com base numa mera suspeita descabida, aquela América parecia temer que existissem pessoas que pensassem como Wyatt e Billy.
Desta forma, foi a vontade da contracultura de abraçar e expressar uma falta de liberdade que assustou a geração mais velha. Easy Rider foi o espelho que apresentou uma visão mais ou menos distorcida (dependendo da postura ideológica) daquela sociedade.
George Hanson, de Jack Nicholson, assume um papel preponderante na história, muito em parte devido a estas palavras: “What you represent to them is freedom…. It’s real hard to be free when you’re bought and sold in the marketplace. But don’t ever tell anybody they ain’t free, cause they’re gonna get real busy killin’…to prove they’re free.”
Um dos prazeres duradouros de Easy Rider é o poder dos recursos visuais. O panorama do deserto e do céu aberto, cortado pelas estradas solitárias, exalta que a cinematografia de Lazlo Kovacs é de tirar o fôlego.
O filme acabou por representar o paradigma de revolta contra um país que estava de costas viradas para o sangue novo. O martírio final de Wyatt e Billy solidificou o seu legado na condição de heróis, dois homens que ansiavam uma América livre, e que morreram na busca desse país ideal.
A meu ver, o que tem mantido este filme tão relevante até hoje incide no facto da distância que se mantém de uma América obcecada pela violência e pela morte. Ao fazê-lo, o filme permanece como o manifesto estridente para toda uma geração. A América nunca mudou a forma de lidar com a guerra, e as palavras de Wyatt ainda ecoam por aí: “we blew it.”.
A bem ou a mal, a longa-metragem é reconhecida por muitos como o primeiro papel de relevo na carreira de Jack Nicholson. Embora pertinente no tema-chave que aborda, estamos perante uma epopeia sobre bebida, amizade, conversas na fogueira e motas. Todavia, a dada altura, a personalidade envolvente de Nicholson, na pele de Hanson, revigora a trama que poderia adivinhar-se cansativa.
Easy Rider é irónico no facto de conseguir abordar em simultâneo a noção de liberdade da “cultura hippie” dos anos sessenta, mas também o desmoronamento da ideologia social daquela altura.
Efetivamente, estamos perante um comentário instantâneo sobre o movimento dos anos 60. É um filme importante.