Depois do sucesso em torno da trilogia “Dollars”, (aka “Man With No Name”), a intenção de Sergio Leone era abandonar o panorama do faroeste, para se dedicar a outros géneros. No entanto, as produtoras americanas só queriam financiar outro “Spaghetti Western”. Desta feita, Leone decidiu conceber uma narrativa sobre o Velho Oeste: “Once Upon a Time in the West”, ou “C’era una Volta il West”.
“Once Upon a Time in the West” foi construído para ir além da grandiosidade de “The Good, the Bad e the Ugly”. Contudo, quando foi lançado, os críticos e o público acharam que o filme era confuso e pesado. Com o tempo, no entanto, a reputação do filme cresceu e agora é considerado por muitos como a obra-prima de Leone.
Na minha opinião, o filme tem algumas falhas graves, mas acabam por ser superadas pelas virtudes consideráveis do trabalho. De muitas maneiras, o filme permanece como um monumento único de expressão cinematográfica. Um dos problemas que Leone tinha com os críticos incidia no facto de (tal como Alfred Hitchcock) muitos considerarem que este não tinha talento artístico e subtileza.
Isto porque a distribuição dramática das composições visuais e sonoras de Leone eram tão enfáticas e absorventes que o público não apreciava. De qualquer forma, a acreditação específica de Leone não é o foco aqui; Este trabalho cinematográfico foi o produto colaborativo de múltiplas personalidades.
O argumento foi baseado numa história encomendada por Bernardo Bertolucci e Dario Argeneto, dois jovens argumentistas que teriam sucesso considerável por conta própria. Bertolucci, na época ainda com apenas vinte e poucos anos, era um cineasta já estabelecido na indústria, cujo currículo contava com obras como “La Commare Secca” e “Prima Della Rivoluzione”. A partir dessa história, o argumento foi escrito por Leone e Sergio Donati.
A fotografia ficou a cargo de Tonino Delli Colli, que para além de Leone, também trabalhou em alguns filmes de Roman Polanski, Louis Malle, Jean-Jacques Annaud, Pier Paolo Pasolini e Federico Fellini. No que toca à banda sonora, peça chave nos filmes de Leone, contou com o selo do seu colaborador habitual – Ennio Morricone.
O conto diz respeito ao destino de quatro personagens que têm tipos distintos de personalidade, e que representam atitudes de um caráter narrativo quase arquetípico.
Harmonica (interpretado por Charles Bronson) é o icónico, taciturno e misterioso “Man With No Name” nesta história. Na verdade, o papel original do “Man With No Name” na trilogia dos “Dollars” havia sido oferecido e rejeitado por Bronson antes de ter sido entregue a Clint Eastwood. Mas, de certa forma, Bronson é a personificação verdadeiramente perfeita deste personagem, já que tem o perfil de vingador implacável.
Frank (Henry Fonda) é a representação da crueldade e do mal, ou por outra, é um narcisista sádico. Lançar Fonda, cuja carreira inteira passou pela representação de personagens íntegros e moralmente seguros, neste papel obscuro foi um golpe de génio.
Cheyenne (Jason Robards, Jr.) é um fora-da-lei que se envolve na história contra a sua vontade. Quanto a Jill McBain (Claudia Cardinale), é a cooperadora pragmática. A inclusão deste papel acrescentou profundidade e humanidade à história de Leone.
A narrativa compreende um conjunto de cenas discretas, a maioria das quais fascinantes e memoráveis. Talvez a melhor delas seja a cena de abertura na estação do comboio. Não obstante, embora geralmente desejemos suspender a nossa descrença e mergulhar na mitologia do Velho Oeste, alguns detalhes narrativos são muito exagerados.
Por exemplo, Harmonica e Frank encontram-se várias vezes durante a história, e, nessas ocasiões, poderiam ter resolvido o problema final inúmeras vezes. Em vez disso, apesar de sabermos que não estão determinados a matar-se um ao outro, acabam por engasgar-se em discursos aforísticos.
Outra fraqueza da obra incide na insensibilidade ao ato de matar e a celebração da vingança como uma missão digna. Harmonica, o herói da história, não tem outro interesse além de satisfazer a sua sede de vingança. Até ao final da longa-metragem, nem conhecemos bem a origem de tanta raiva, mas a sua busca incansável pela “justiça” antiquada é arrepiante.
E, no entanto, o filme tem as suas forças inegáveis. A cinematografia magistral de Leone é tão convincente que exalta um final artístico. As imagens são tecidas numa tapeçaria visual que se encaixa num mundo de sonhos. O uso do som nas duas cenas iniciais é notável. Na cena da estação do comboio, o som estridente que o moinho emite antecipa algo terrível que está prestes a acontecer.
Ennio Morricone superou-se também na banda sonora. Cada um dos quatro personagens principais tem um tema musical quando surge.
Assim, “Once Upon a Time in West” é mais do que uma representação da chegada da civilização tecnológica, simbolizada pela ferrovia, a um território bárbaro. Todas as sociedades e civilizações têm as suas narrativas subjacentes à maneira como se descrevem.
Por conseguinte, o faroeste também tinha as suas próprias narrativas sobre integridade, resistência e independência. Este filme presume que o público está familiarizado com a mitologia do Velho Oeste, e isso é complementado pela inclusão de várias imagens familiares de Hollywood (como o Monument Valley) e das personagens de Jack Elam, Keenan Wynn ou Woody Stroder.
Em particular, Frank representa a adulteração narcisista final destas características. E Jill, por outro lado, representa compaixão, compromisso e trabalho pelo espírito de paz. O fato de Leone ter escolhido Claudia Cardinale para interpretar esta personagem indica que ela é o verdadeiro herói (heroína) da sua história.