“I, Tonya” traz-nos a história da vida e carreira da patinadora Tonya Harding, contada de uma maneira cativante, cómica e dramática que capta logo o interesse do público.
A história é contada através de entrevistas aos personagens envolvidos, sendo a personagem principal a patinadora Tonya Harding. Interpretada eximiamente, diga-se, por Margot Robbie, que conseguiu um papel à altura do seu talento.
Começamos com Tonya em criança a ser “empurrada” para a patinagem artistica com 3/4 anos pela mãe, LaVona Golden (interpretada pela maravilhosa Allison Janney). Desde esse momento conseguimos ficar solidários com a pequena.
E claro, Tonya vai crescendo e vai sendo cada vez mais pressionada. Há certos acontecimentos que vão marcar o que ela vai fazer do resto da vida. Um exemplo é a saída do pai de casa. E nós percebemos porque ao conhecermos LaVona, uma mulher sem papas na língua, terrivelmente direta e fria. LaVona fuma cigarros como se fosse uma chaminé e tem o álcool como melhor amigo. Sabemos que é quase impossível viver naquela casa. A questão é que ele deixou a filha a defender-se sozinha das loucuras da mãe. LaVona não se dava ao trabalho de mostrar qualquer tipo de afeto por Tonya.
Neste quadro familiar distorcido, claro que Tonya acabaria por se apaixonar muito nova pelo que viria a ser o seu futuro marido, Jeff Gillcoly, interpretado por Sebastian Stan, e escusado será dizer que foi tudo menos uma relação saudável. São vários os momentos em que os vemos a discutir, a baterem um no outro intensamente em momentos em que ficamos chocados a olhar para aquilo mas ao mesmo tempo é quase impossível não rir. Se calhar por nem querermos acreditar que toda a vida de Tonya passava por aquilo. Como ela chega a dizer durante o filme: “A Nancy apanha uma vez e todo o mundo enlouquece. Para mim, era uma coisa recorrente”.
Mesmo que não estejamos dentro do mundo da patinagem, sabemos que a apresentação da pessoa por vezes conta mais do que o talento em si. Tonya foi muitas vezes prejudicada pela maneira como se vestia. Não gastava rios de dinheiro nos vestidos, acabando por ser ela mesma a fazê-los. Nunca foi a mais bonita nem a mais arranjada a nível de maquilhagem. Mesmo que ela fosse das melhores, senão mesmo a melhor patinadora ali…
Uma pessoa que dedica a sua vida a um desporto, não tendo mais nada para além disso, claro que tem a ambição de ser a melhor. Até mesmo esse percurso é atribulado para ela, porque mudou de treinadora. Teve inclusive um problema com os patins a meio de uma competição, mas conseguiu sempre chegar onde quis.
Chega mesmo a receber ameaças de morte que Jeff achava que vinham da parte de Nancy Kerrigan, uma das melhores patinadoras e concorrente de Tonya, apesar de elas serem amigas. E a partir daí, tudo descamba.
Já não é novidade que para os atores é sempre complicado interpretar personagens que correspondem a pessoas na vida real. É necessário serem fiéis à história e ao que ela acarreta. E por isso, é importante referir que Margot Robbie leva Tonya Harding a outro nível, tanto na pista do gelo como fora dela. Ela é poderosa a mostrar as convicções de Tonya na vida pessoal e na vida profissional, é cómica, tem a sua dose de loucura (como não naquele ambiente) mas conseguimos ficar solidários com ela de uma maneira em que ficamos contentes quando ela consegue alcançar algo bom para a sua vida, mesmo quando se torna a “vilã” da história e da América.
“Os americanos procuram alguém para amar e para odiar.”
Tonya Harding para além de ter sido uma grande patinadora, foi a primeira americana (e a segunda mulher) a conseguir fazer um axel triplo. Foram muitas as que tentaram fazer este salto e muitas as que falharam. Como tal, isto pôs Tonya nas bocas do mundo. Mas em 1994, tudo mudou quando o seu ex-marido se une a um amigo pouco inteligente e juntos, orquestram um plano para partir os joelhos a Nancy Kerrigan.
Apesar da lesão de Kerrigan não ter sido tão grave como previsto, e de ela ter conseguido recuperar a tempo dos Jogos em Lillehammer, o escândalo já corria todos os meios de comunicação e desconcentrava Tonya.
No filme também vemos o julgamento. Ficamos a saber que Jeff fez um acordo para testemunhar contra a ex-mulher e levou apenas 18 meses de prisão. Tonya, que sempre afirmou que desconhecia o plano e que não tinha nada a ver com aquilo, foi impedida de voltar à sua vida de competição de patinagem, que era tudo o que tinha, após ter acabado em oitavo lugar nos Jogos Olímpicos na segunda vez em que participou – e a última.
Mais tarde, o seu passado de violência e também com a raiva de ter perdido tudo o que tinha, começou uma carreira no pugilismo. E não seria o mesmo se o filme não acabasse com uma bela cuspidela de sangue no chão do ringue. Mas com Tonya, obviamente, a não se render.
Craig Gillespie consegue mostrar-nos um pouco do mundo e da história de Tonya Harding de uma maneira cativante mas simultaneamente mágica. Ficamos impressionados ao vermos Tonya a patinar. Chocados ao ver as cenas de violência doméstica. No entanto, nunca conseguimos tirar os olhos do ecrã.
A banda sonora é composta por Mark Batson, Laura Branigan, Fleetwood Mac, Chicago, entre outros nomes conhecidos… Ajuda a compôr a história e a dar-lhe ainda mais adrenalina.
É daqueles filmes em que o tom de exagero/rídiculo dado às personagens resultou muito bem, muito devido aos atores. Com as suas brilhantes interpretações, ajudaram a transmitir o drama e o escândalo na vida da patinadora Tonya Harding.