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Ennio Morricone: Obrigado, Maestro!

by João Pedro

O Morricone Sound nasceu com a “The Dollars Trilogy”, mas foi além de qualquer limite de género musical ou cinematográfico, com um ecletismo que influenciou uma geração de músicos como Yo-Yo Ma, Hans Zimmer, John Zorn, John Zorn, Mike Patton e bandas de rock como Muse, Pixies, Metallica e Primus.

Nascido em Roma, no dia 10 de novembro de 1928, Ennio Morricone era o mais velho de cinco irmãos. O pai tocava trompete.

Depois de estudar trompete e composição, no Conservatório da Accademia Nazionale di Santa Cecilia, na capital italiana, começou a trabalhar como trompetista e, em seguida, em empresas discográficas.

Em 1961, escreveu a sua primeira banda sonora para um filme, “Il Federale”, uma comédia agridoce ambientada nos momentos finais do fascismo.

Naquela década, Morricone trabalhou com Gillo Pontecorvo, primeiro em “The Battle Of Algiers”, o clássico a preto e branco que representava a revolta da Argélia contra os franceses, e mais tarde em “Queimada”, uma história de colonialismo protagonizada por Marlon Brando.

Morricone recebeu a primeira nomeação ao Oscar para Melhor Banda Sonora Original, pelo seu trabalho em “Days Of Heaven”, de Terence Malick.

Talvez o seu trabalho com o cineasta Sergio Leone (que era um colega de escola de Morricone), seja, instantaneamente, o mais reconhecido. “The Dollars trilogy”, que integram aquele movimento dos Spaghetti Westerns, na década de 1960, perdura na memória dos fãs de cinema.

Ao escolher um som sombrio, orgânico e escasso, ao passo de junções exageradas em termos de orquestra, Morricone criou um estilo próprio, ao adicionar tiros, assobios e guitarras elétricas para criar um elemento narrativo na música.

Leone colocou a música de Morricone em destaque, como protagonista fundamental da narrativa, servindo como elemento retórico para enfatizar emoções e sentimentos que não eram claros numa história de heróis subtis e lacónicos.

Mais do que um elemento do filme, a música de Morricone tornou-se um papel importante em pé de igualdade com “The Man with No Name”.

Morricone e Leone também trabalharam juntos em “Once Upon A Time In America”, uma aventura de gangsters judeus, em Nova Iorque, que explora os temas da amizade, amores perdidos e a passagem do tempo.

O filme, que foi protagonizado por Robert De Niro e James Woods, é considerado por alguns como a obra-prima de Leone, graças em parte à banda sonora evocativa de Morricone, que apresentou uma sessão exuberante tocada em violinos.

O Morricone Sound nasceu em “The Dollars Trilogy”, mas foi além de qualquer limite de género musical ou cinematográfico, com um ecletismo que influenciou uma geração de músicos como Yo-Yo Ma, Hans Zimmer, John Zorn, John Zorn, Mike Patton e bandas de rock como Muse, Pixies, Metallica e Primus.

Na ocasião em que expressão “compositor de bandas sonoras” pode vir à mente, é difícil não pensar em Ennio Morricone à primeira vista. O “Maestro” construiu um corpo de trabalho que está espalhado por mais de 500 filmes.

Para além de “The Hateful Eight”, de Tarantino, que lhe valeu o único Oscar na carreira, as outras nomeações foram com “The Mission” (1986), “The Untouchables” (1987), “Bugsy” (1991) e “Malèna” (2000).

Ainda me falta tanto para conhecer do trabalho de Morricone. O legado é imenso e esbelto. Do que já ouvi, estas foram as bandas sonoras que marcaram a minha condição de apreciador de cinema:

  • “A Fistful of Dollars” (1964)

Este filme foi inovador para o que se fazia em torno dos Westerns. Os movimentos violentos e cínicos de Leone, deram origem a duas lendas: Clint Eastwood e Ennio Morricone.

Eastwood criou uma carreira naquele personagem, The Man With No Name, e Morricone tornou-se o compositor oficial da banda sonora do chamado Spaghetti Western.

O filme é vagamente baseado em “Yojimbo”, de Kurosawa, cuja banda sonora foi composta por Masaru Sato, resultado de uma combinação entre música ocidental e Henry Mancini.

Leone conhecia Morricone desde a infância (ambos estudaram na mesma escola), e a parceria estendeu-se até ao seu último filme.

Após “A Fistful of Dollars”, os Westerns tinham duas opções: contratar Morricone ou contratar alguém para fazer uma banda sonora que Morricone faria.

O famoso “Django theme”, de Luis Bacalov (“Django”, realizado em 1966 por Sergio Corbucci) pode ser considerado um exemplo. Em “Django Unchained”, de Quentin Tarantino, a música de Bacalov está lado a lado com os trabalhos de Morricone na banda sonora.

Com baixo orçamento para compor as músicas, o compositor italiano substituiu a Orquestra por justa-posições de sons fora do comum, ao evocar a natureza selvagem no cenário.

 

  • “The Battle of Algiers” (1966)

Este foi o primeiro trabalho de Morricone com Gillo Pontecorvo.

A banda sonora é composta por diferentes peças musicais, com influência na música árabe.

Este trabalho expandiu o horizonte musical de Morricone, e mostrou que ele não se limitava aos clichés do Western. Desta forma, produziu uma banda sonora cheia de elementos e humores diferentes: tensão climática produzida por notas repetidas num piano a dialogar com trompetes.

O tema principal é denso e carregado de intensidade a cada momento. A bateria é protagonista no começo e no final da música, e evoca o tom militar do filme e a atmosfera pesada.

Mais tarde, esta música foi usada em “Inglorious Bastards” de Quentin Tarantino, na cena em que Brad Pitt resgata o sargento Hug Stiglitz de uma prisão nazi.

 

  • “Once Upon a Time in the West” (1968)

Há duas obras neste filme que se tornaram uma entidade: a “The Theme Song” e ”The Man with the Harmonica”.

A primeira é uma melodia divina tocada por violinos, que se transforma num épico soprano. A última é uma música tocada por uma gaita, que começa com o vazio do deserto, e que vai assumindo a transformação numa explosão violenta.

A música é “theme of Harmonica” (Charles Bronson), e é explorada por Leone na cena dos bares, quando há um efeito de sombra / luz combinado com a apoteose da música.

Os Muse usaram-na como abertura para “Knights of Cydonia”, que é um épico rock influenciado por Morricone.

 

  • “Love Circle” (1969)

Esta banda sonora é extremamente rica em estilos e géneros, e varia entre as experiências do Euro Pop, Bossa Nova e Western Music.

O tema do filme é um derivado da Bossa Nova, do amor de Morricone pela música brasileira. No documentário “Il Malamondo”, Morricone começou a criar trabalhos influenciados por ritmos de samba e bossa, como “Muscoli di Velluto”.

Mais tarde, isso foi explorado em “Samba in Tribunale”, de “Il Gatto”, de Luigi Comencini. Morricone também trabalhou com o compositor brasileiro Chico Buarque em “Per un Pugno di Samba”, quando Buarque morava em Roma devido à extradição do regime militar brasileiro.

 

  • “1900” (1976)

Bertolucci tinha trabalhado em “Once Upon a Time in the West”, com Dario Argento e Sergio Leone. Ele foi argumentista do filme, e fez uma pesquisa vasta com Argento sobre a Westerns, para criar o enredo para a homenagem de Leone.

Mas, em 1976, Bertolucci quis usufruir de um trabalho de Morricone, produzido para o seu filme sobre a história italiana.

Protagonizado por Gerard Depardieu e Robert De Niro, “1900” incide na história de dois italianos ao longo da primeira metade do século XX, um período caracterizado por tensão política, visto que a Itália, um país recentemente independente e unido, testemunhou o surgimento do regime fascista na figura de Benito Mussolini.

A banda sonora é melancólica e nostálgica.

 

  • “Once Upon a Time in America” (1984)

Na última parceria entre Leone e Morricone, esta banda sonora é uma mistura surpreendente de melodias memoráveis (The Theme Song), momentos dolorosos (Deborah’s Theme) e sons de nostalgia proporcionados por uma Flauta de Pan (Cockeye’s Song). Wong Kar-Wai usou a música desta partitura no seu “The Grandmaster”, em homenagem a Morricone e Leone.

 

  • “The Untouchables” (1987)

Brian de Palma escolheu um compositor italiano para produzir a banda sonora do seu conto de gangsters alimentado com cocaína (“Scarface”, marcado pelo lendário compositor Giorgio Moroder).

Quando decidiu realizar um filme sobre Al Capone e a proibição de álcool, a escolha natural foi Ennio Morricone, um compositor capaz de criar sons heroicos e corajosos para a luta dos intocáveis contra o clã de Capone, uma melodia com batidas de tambor e trompetes, e um cenário assustador para um dos momentos mais famosos da história do cinema, o tiroteio na Union Station (Machine Gun Lullaby).

 

  • “Cinema Paradiso” (1988)

O filme de Giuseppe Tornatore é uma homenagem metalinguística ao cinema. É um conto sobre amizade, amor, infância e a idade adulta. A Love Theme de Ennio Morricone condensou todos estes sentimentos em apenas uma música.

Morricone sempre disse que não era um virtuoso do piano. Não importa.

“The Love Theme” é uma melodia graciosa que representa e dá cor ao humor suave e ao espírito nostálgico do filme.

 

  • “Malèna” (2000)

Este filme é ambientado na Sicília durante a Segunda Guerra Mundial, e conta a história de um jovem que se apaixona por uma mulher mais velha.

A sociedade siciliana serve de pano de fundo para esta história de amor. A banda sonora é uma continuação de “Cinema Paradiso”: melodias comoventes cheias de nostalgia sobre Itália.

Morricone nunca viveu fora de Itália, mas o seu trabalho teve que viajar para Hollywood para se tornar conhecido mundialmente.

“Malèna” parece uma homenagem à Itália que Morricone nunca abandonou e que nunca o abandonará.

O Maestro é uma herança cultural. Surge lado a lado com Leonardo da Vinci, Spaghetti, Fellini e Pavarotti.

 

  • “The Hateful Eight” (2015) 

Geralmente, Tarantino evita trabalhar com bandas sonoras originais nos seus filmes.

Ele é conhecido por reunir músicas, e efetuar a compilação num pequeno pack para o resultado final.

Antes de “The Hateful Eight”, Morricone tinha contribuído apenas com uma música original para um filme de Tarantino. Embora o uso da música existente por parte do realizador não seja algo negativo, ouvir todo um trabalho original de Morricone é um sonho.

Tal como o próprio filme, a banda sonora é misteriosa. É a reminiscência dos antigos trabalhos de Morricone, nos Spaghetti Westerns, mas também oferece algo novo e original. Não tem nada a ver com o que encontramos nos blockbusters modernos, e é por isso que se destaca. É único, cativante e genuinamente especial.

Obrigado, Maestro! 

Ennio Morricone; Uma despedida

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