Belfast é o novo filme realizado por Kenneth Branagh que, embora só chegue agora aos cinemas em Portugal, já é um dos favoritos ao prémio de Melhor Filme nos Óscares 2022.
Todos conhecemos alguns dos trabalhos de Kenneth Branagh como ator, mas também como realizador de filmes como o Thor, Murder on the Orient Express e, até do filme que estreou apenas este ano, Death on the Nile. Agora, chega-nos uma história bastante pessoal para Kenneth, que nos entrega uma “autobiografia” sobre a sua infância, em Belfast de 1969, um ano em que decorriam os conflitos na Irlanda do Norte que ficaram conhecidos como The Troubles.
Conhecemos então Buddy (Jude Hill) que nos leva numa viagem no tempo pela sua infância em conjunto com a sua família, composta pela sua mãe (Caitriona Balfe), o seu pai (Jamie Dornan), o seu irmão (Lewis McAskie) e ainda a sua avó (Judi Dench) e o seu avô (Ciáran Hinds).
Belfast é acima de tudo um filme muito pessoal e muito especial para os irlandeses, porque é retratado ali em grande foco, através de uma família de protestantes que vive em comunhão na mesma rua com cristãos até que a guerra civil acontece e vêem-se no meio de um conflito que vai mudar a vida de todos. E quando temos a cena inicial do filme, ficamos imediatamente impactados pela história de Belfast e a mensagem que quer passar.
E Buddy é sem dúvida a alma deste filme. Jude Hill, o ator, tem um carisma e expressões tão engraçadas que em todos os momentos em que ele aparece, só queremos continuar a acompanhá-lo e a saber mais dele, sendo mesmo conquistados pela inocência da sua personalidade. Ninguém diria que é a sua estreia numa longa-metragem. É um menino que gosta de brincar na rua, que gosta de ir ao cinema, que gosta de ver filmes na televisão (os únicos momentos a cor, quase como um escape de Buddy de tudo o que está a acontecer na sua região e na sua família) e por isso mesmo, é fácil identificarmo-nos com esta personagem.
Ainda hoje não entendo como é que Caitriona Balfe não foi nomeada por este filme, fosse para Melhor Atriz Principal ou Secundária. Ao longo do filme, com Jude Hill e com Jamie Dornan, entrega-nos cenas emocionais bastante intensas provando mais uma vez o seu talento (já comprovado em Outlander). Também Dornan, assumindo o papel de pai, mostra-nos que é capaz de se afastar de alguns papéis que temos visto dele ao longo dos anos, não fosse esta também uma história muito pessoal para ele, também nascido na Irlanda do Norte.
Por fim, para além destes atores que se destacaram, quero também realçar um dos dois nomeados na representação deste filme que é Ciáran Hinds, que nos entrega diálogos e cenas com Buddy fantásticas e deliciosas de se ver. Para mim, Judi Dench esteve bem, como está sempre, mas não senti que em momento algum se destacou, até porque o argumento também não deixou. Contudo, e com o seu parceiro de ecrã, conseguiu uma nomeação para Melhor Atriz Secundária. Se vos posso dizer que concordo? Não concordo. Mas entendo que acabe por ser o efeito Leonardo DiCaprio, embora ache que se deve reconhecer Judi Dench por toda a sua carreira.
Kenneth Branagh tem uma coisa que gosto particularmente na sua forma de realizar que é criar uma aproximação com as personagens através de planos fechados, para que foquemos a nossa atenção no que a personagem está a dizer mas principalmente a sentir. Não costumo ser fã dos trabalhos dele no geral, mas tenho de admitir que neste filme esmerou-se, talvez por a história lhe dizer tanto o que faz com que tenha tudo bem estruturado na sua cabeça e como o quer mostrar ao mundo.
A sua decisão de fazer um filme a preto e branco apela igualmente à emoção porque nos abstrai de todas as distrações que possam existir ao longo do mesmo e, de certa forma, faz-nos criar uma ligação maior com a família que nos é apresentada. Senti com Belfast o mesmo que senti com Roma e acho que quebra aquele estigma de que filmes a preto e branco é só em filmes mais antigos.
Se este filme é um Óscar pretender ou um Óscar contender? Bom, sem dúvida que posso dizer que Belfast não me causou o entusiasmo conforme as expetativas que toda a gente criou à volta deste filme. Mas não posso negar toda a emoção que o filme traz e o quão nos leva a refletir e a querer saber mais sobre a história depois de o vermos.
Acho que de forma singela, Kenneth Branagh conseguiu mostrar-nos um pouco mais de si, do seu olhar como realizador e ainda como argumentista e consegui entregar uma homenagem bonita a todos os que ficaram em Belfast durante estes acontecimentos, mas sem esquecer todos aqueles que foram obrigados a partir.