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Asteroid City – Crítica Filme

by João Pedro

Existem certos dados adquiridos quando um novo filme de Wes Anderson chega às salas de cinema. Sabe-se que vai ter um aspeto muito melhor do que a maioria dos outros filmes que vimos nesse ano, e, em adição, sabemos também que vai contar com um elenco repleto de estrelas. No entanto, não há a garantia de que um novo filme de Anderson ofereça uma narrativa convincente ou personagens interessantes para todas essas celebridades. É, quanto a mim, o caso de “Asteroid City”, um filme deslumbrante que tem como protagonistas, bem… toda a gente, mas que tem pouco interesse em histórias, enredos e personagens.

Se o filme anterior de Anderson, “The French Dispatch”, foi uma carta de amor a uma época em que a América levava o jornalismo a sério, o início de “Asteroid City” sugere que o cineasta pretendia fazer algo semelhante em relação à era dourada do drama televisivo americano. Somos recebidos por Bryan Cranston, que interpreta o tipo de apresentador que sente que é seu dever educar as massas sobre a forma de arte séria do drama televisivo. Estamos em 1955, numa altura em que todos os escritores viviam felizes por trabalhar num meio que ainda não tinha desenvolvido uma reputação de pastilha elástica para os sentidos. Um desses escritores é Conrad Earp (Edward Norton), o dramaturgo por detrás do subsequente drama dentro do drama.

O referido drama (embora drama seja uma palavra forte para caraterizar este tédio pitoresco) gira em torno de uma convenção para cientistas realizada em Asteroid City, uma pequena cidade no meio do deserto do Nevada, onde um pedaço de detritos espaciais pousou há vários milhares de anos. Mal sabem os convidados que serão colocados em quarentena na cidade após a chegada de um alienígena (que parece ser uma animação em stop-motion, mas que surge nos créditos como sendo interpretado por Jeff Goldblum).

© 2022 Pop. 87 Productions LLC

As personagens que habitam Asteroid City parecem ligeiramente peculiares, mas são todas surpreendentemente insípidas. O mais próximo que o filme tem de assumir a pele de drama tradicional é o romance improvável entre um fotógrafo de guerra (Jason Schwartzman) e uma estrela de cinema obcecada em si mesma (Scarlett Johansson). Acaba, contudo, por não chegar a algum lugar digno de nota, tal como também não chega o flirt entre uma jovem professora (Maya Hawke) e um cowboy (Rupert Friend). Outras personagens entram e saem do filme de forma pontual, como Tom Hanks, Jeffrey Wright, Tilda Swinton, Adrien Brody, Margot Robbie, Liev Schrieber, Hope Davis e Willem Dafoe, para citar apenas alguns, com a maioria a ter tanto tempo de ecrã como uma participação especial de Hitchcock.

De vez em quando, deixamos a narrativa principal para regressar ao drama dos bastidores, que não passa de uma forma de gastar tempo. Ver o dramaturgo de Norton a fazer uma audição a Schwartzman como ator para interpretar a personagem de Asteroid City, ou Brody como realizador a meio de um divórcio, não acrescenta nada. O cenário de Asteroid City é conhecido por uma grande cratera deixada por aquela rocha que caiu dos céus há milénios, e o filme tem um buraco igualmente enorme onde o drama deveria estar. É irónico que Anderson escolha evocar o drama americano de meados do século, que era conhecido pelo seu compromisso resoluto com a narrativa e carácter, dois elementos que, a meu ver, estão aqui em falta.

A substância está teoricamente presente: fala-se muito de luto, da relação dos que ficam com os que partem, tanto a curto como a longo prazo. Seja um pai, um cônjuge, uma pessoa de quem se está afastado. No entanto, o filme apresenta apenas frases de efeito para abordar estes temas, revelando-se muito mais apaixonante quando surge uma piada aleatória ou alguma virtuosidade de realização.

© 2022 Pop. 87 Productions LLC

A impressão é que aqui e ali há também um trabalho de reciclagem: a banda sonora é montada com dificuldade, com referências tão fortes aos “sons andersonianos” dos filmes anteriores que nos perguntamos se o realizador não terá simplesmente experimentado as bandas sonoras existentes, concentrando-se nas canções country inéditas que servem de mordaça do filme.

A repetição de grande parte do setor de atuação não ajuda a afastar a suspeita de que não há nada de novo e relevante a dizer. Parece que não existe a centelha vital que leva o público a importar-se com os personagens. Claro que, visualmente, é incrível, com miniaturas e cenários que lembram as criações de outro Anderson, a lenda da TV infantil britânica – Gerry.

Anderson parece um pouco apaixonado demais pelos seus cenários, com a câmara a movimentar-se constantemente, a fazer panorâmicas e a procurar, como se o público tivesse de perceber com clareza a quantidade de artesanato que foi utilizada na sua construção. É por isso que, na minha ótica, este filme trata-se mais da experiência de explorar o cenário de um jogo elaborado do que na ação de o jogar propriamente. Sim, é um mundo detalhado cuidadosamente, mas parece que Anderson desceu um degrau na sua carreira. Não obstante, para ele, descer um degrau ainda é conceber um filme com glamour.

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