Home FilmesCinema “Ad Astra”: O espaço como metáfora de algo maior

“Ad Astra”: O espaço como metáfora de algo maior

by The Golden Take

“Ad Astra”, realizado por James Gray e protagonizado por Brad Pitt, é um filme intimista, intenso e que requer reflexão por parte dos espetadores. Estreou dia 19 de setembro nos cinemas portugueses e é certo que poderá estar na corrida para os Golden Globes e Óscares. 

“Ad Astra” traz-nos a história de um futuro não muito distante em que Roy McBride (Brad Pitt), que passou a vida toda a preparar-se para ser astronauta, fica encarregue de uma missão secreta que passa por viajar aos lugares mais remotos do sistema solar para descobrir a origem das sobrecargas eléctricas que ameaçam o planeta Terra.

Porém, essas sobrecargas têm origem no projecto LIME, projecto esse chefiado pelo pai de Roy. Como tal, ele tem a missão de não só descobrir a origem do problema mas também com a hipótese remota de se reencontrar com o pai, Clifford McBride (Tommy Lee Jones) na sua última localização conhecida, depois de este o abandonar para ir nesta aventura.

Tudo isto representa muito no filme porque o astronauta/major lida com várias questões como o abandono, a solidão, o facto de toda a sua vida se ter focado em seguir uma carreira da qual o seu progenitor se orgulhasse, afastando-se de tudo o que tinha de bom na sua vida – um dos exemplos que temos é o da sua mulher, que também o deixa, por sentir que ele está distante.

E o curioso aqui é que até nós nos sentimos distantes destas ligações que a personagem tinha, porque nunca vemos efetivamente Liv Tyler sem ser por memórias ou mensagens de vídeo deixadas.

Photo by Francois Duhamel – © Twentieth Century Fox

Agora convenhamos, este filme tem uma história base mas ele é muito mais do que isso. É um filme que não vai ser fácil de ver para quem procura entreter-se ou para quem simplesmente está com a expectativa de ver o Brad Pitt no espaço.

É um filme que puxa muito influências de “2001: A Space Odyssey” e é notório alguns aspectos de Kubrick aqui, mas é principalmente um filme sci-fi no espaço que acompanha a vida de um personagem e que exige uma reflexão do espectador que às vezes não está simplesmente preparado para isso e vai ser apanhado desprevenido.

É um filme slow burn, porque assim o precisa de ser, mas se não é muito o vosso género, este não vai ser o vosso filme, mesmo que gostem muito de filmes no espaço.

Como dizia, o filme é mesmo muito lento. Percebe-se porque é que precisa de ser assim, porque obriga mesmo o espectador a estar atento às questões todas que estão a ser postas em cima da mesa e a fazer uma introspecção mas há momentos em que há um exagero e basta isso para que facilmente se perca a atenção, por muito que uma pessoa queira continuar interessada.

Não obstante, não é isso que lhe tira mérito. Se efectivamente conseguirem ultrapassar a questão de ser lento e se realmente continuarem a tentar desmistificar todos os pensamentos de Roy, o filme vai-vos conquistar.

Posso-vos dizer que a cena de abertura do filme está lindíssima de se ver, não só pelos efeitos visuais e de sentirmos que estamos mesmo no espaço, mas também pela maneira como foi feita a sequência. Aliás, todo o filme a nível visual é lindíssimo de se ver, os efeitos visuais estão espectaculares e há momentos em que parece uma pintura, não fosse o diretor de fotografia Hoyte Van Hoytema, que fez filmes que a nível de cinematografia são igualmente fantásticos como “Interstellar” e “Dunkirk“.

Photo by Francois Duhamel – © Twentieth Century Fox

A nível de banda sonora, eu sou sempre muito crítica. Para mim, ajuda a dar/estabelecer o tom do filme e ajuda muito a que estejamos envolvidos no mesmo. Neste filme, é importante ouvir a banda sonora e perceber de que forma é que ela se encaixa nas cenas. Neste e em qualquer filme no espaço em que temos os instrumentais ou um silêncio característico do espaço e nesta longa-metragem há um equilíbrio dos dois. Temos momentos de tensão silenciosos e temos outros com instrumentais poderosos.

E não se enganem: este é o filme do Brad Pitt que claramente está nas bocas do mundo depois de uma grande interpretação em “Once Upon a Time in Hollywood e agora em “Ad Astra”. O ator carrega a narrativa e consequentemente o peso e intensidade do filme todo “aos seus ombros”, por assim dizer. Todas as emoções e reflexões passam por ele para chegar até nós. Há momentos em que a constante narração de Roy atrapalha o seguimento do filme devido a por vezes constatar o óbvio sem especial necessidade.

Mas Pitt não precisa de se esforçar fisicamente, por exemplo. Emocionalmente sim. Ele está vazio, – diga-se a sua personagem. Ele regista o seu estado psicológico como regista o batimento cardíaco, no tom mais monótono que consegue dar. Ele só precisa de nos passar essa sensação de vazio e de se expressar emocionalmente quando precisa, como quando certas situações acontecem que acabam por o marcar ou quando fala do pai e do que sente.

Em tom de brincadeira, eu apelido este filme de “The Revenant” do espaço, porque percebo que James Gray tenha feito um esforço tremendo em passar-nos a versão mais realista das viagens espaciais – e do quão aborrecidas e demoradas podem ser quando se está sozinho – assim como fazer com que o protagonista passe por mil e um obstáculos como explosões, quedas, avarias e até mesmo situações a nível emocional, num cenário lindíssimo de se ver, com uma cinematografia espectacular, uma banda sonora incrível e em que temos uma narrativa que tem como base as relações pessoais e o reencontro com um ente querido.

O espaço aqui nota-se que não é meramente um cenário bonito e que pronto, ver o Pitt no espaço era algo que já queríamos há muito que acontecesse. O espaço acaba por funcionar como metáfora. Se pensarmos bem, Roy acaba por se distanciar de tudo e todos porque tem um foco. O pai dele fez o mesmo. Pode-se mesmo dizer que eles estão vazios, tal como o espaço, à procura de vida que acaba por ser meramente o objectivo deles. Roy tenta encontrar um sentido para a vida dele enquanto procura por vida.

Complexo, certo? O filme deixa-nos assim mas vocês poderão entender o que digo quando o virem.

Não me vou alongar muito mais porque é mesmo complicado conseguir explicar o filme sem vos spoilar por isso deixo ao vosso feedback o que retiram do filme depois de o ver. Em suma, preparem-se para um ritmo lento mas intenso e que vai fazer com que reflictam sobre o mesmo muito depois de saírem do cinema.

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